Descaso do governo deixa Polícia Federal estagnada

Data: 14/01/14

 

A Polícia Federal, uma das instituições mais respeitadas e de credibilidade do País, atravessa uma crise interna que está refletindo em seu desempenho. De um lado, agentes, escrivães e papiloscopistas, que reclamam da falta de reconhecimento por parte do governo federal com a categoria; do outro, os delegados, que, sem a mão de obra intelectual e de ação dos três primeiros, veem seus trabalhos de investigação prejudicados. Resultado: a instituição está praticamente estagnada em todo o Brasil.

O diretor de Seguridade Social da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), o agente Marcus Firme dos Reis, explica que todo o trabalho de investigação é realizado pelos agentes, escrivães e papiloscopista. Eles são responsáveis pelas investigações em campo, interceptações telefônicas (quando autorizadas pela Justiça) e outros procedimentos.

O dirigente classista frisou que os profissionais da Polícia Federal são regidos pela Portaria 523/1989, que prevê que as atividades dos agentes, escrivães e papiloscopistas são de nível médio. No entanto, acrescentou Marcus Firme, o governo federal, na hora de publicar editais para a abertura de concurso para qualquer cargo na Polícia Federal, exige do candidato o curso superior:

“O governo esquece que, a partir da Constituição Federal de 1988, a Polícia Federal passou a ter diversas outras atribuições, como o controle de armas e de agentes químicos. A lei de 1996 passou a exigir que todos os candidatos a cargos na Polícia Federal tenham nível superior completo, o que é um ganho para a instituição e à sociedade. Aqui mesmo no Espírito Santo temos um  agente com mestrado em Física e logo ele terá doutorado. O conhecimento que tem na área ele dá ao povo brasileiro, por meio de seu trabalho na Polícia Federal. Mas o trabalho dele e de todos os colegas não é reconhecido pelo governo federal”, disse Marcus Firme, que acrescentou:

“Continuamos, equivocadamente, sendo regulamentados por uma portaria de 89, que nos trata como sendo profissionais de nível médio. É assim que o governo pensa e age quando define o salário de um agente federal, por exemplo. O agente, em início de carreira, recebe R$ 5 mil líquidos. Já um delegado federal, em início de carreira, recebe R$ 14 mil líquidos”.

Segundo o dirigente da Fenapef, há mais de seis anos a categoria tenta negociar com o governo federal melhoria salarial e uma reestruturação para a Polícia Federal num todo: “Há uma má vontade muito grande para com a Polícia Federal, inclusive com diminuição de verba para a instituição, o que enfraquece o trabalho ainda mais. O contracheque dos agentes federais em janeiro de 2014 é o mesmo de 2009. Como o governo não reconhece a categoria como sendo de nível superior, o nosso salário é baixo”, disse Marcus Firme.

Segundo ele, “devido à falta de reconhecimento por parte do governo federal, os agentes federais passaram a fazer somente o que determina a portaria de 89, que nos trata como sendo profissionais de nível médio”. Marcus Firme explica então porque a Polícia Federal está estagnada:

“Só realizamos missões que estejam dentro de nossas atribuições. Os agentes, escrivães e papiloscopistas só cumprem o que é de atribuição de nível médio. Em tese, os delegados é que realizam as atribuições de nível superior”.

Para o presidente do Sindicato dos Policiais Federais do Espírito Santo, Marivelton Fernandes de Souza, o tratamento inadequado dispensado pelo governo federal à Polícia Federal “provoca descontentamento e desmotivação”. Segundo ele, “esta crise reflete, infelizmente, em todo o trabalho da Polícia Federal. Tudo que queremos é a reestruturação do órgão, que vem sendo discutido há mais de seis anos”.

Ele pondera que o agente e outros profissionais da Polícia Federal dão dedicação exclusiva à instituição. “Depois de aprovado em concurso público, o agente fica de quatro a seis meses fazendo curso na Academia Nacional da Polícia Federal (ANP), em Brasília. Depois do curso, toma posse e vai trabalhar em um dos estados de fronteira. A maioria fica longe de casa por mais de três anos – isso quando dá sorte, porque muitos atuam nas fronteiras até por cinco anos antes de conseguir remoção para outros centros, próximos a seus familiares. E, mesmo assim, o governo nos trata com descaso”, pontuou Marivelton Fernandes de Souza.


Números comprovam estagnação


Relatório da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) revela que a Polícia Federal reduziu as operações de combate à corrupção nos últimos anos. O documento aponta queda significativa em investigações dos crimes de peculato, concussão, emprego irregular de verba pública, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro, entre outros crimes que, em linhas gerais, indicam malversação de recursos públicos.

Segundo a Fenapef, o total de indiciamentos nesses crimes caiu de 10.164, em 2007, para 1.472, em 2013 - uma redução de 86%. De acordo com a Fenapef, a queda das operações de combate à corrupção começou a partir de 2007, quando o delegado Luiz Fernando Corrêa assumiu a direção da PF em substituição a Paulo Lacerda. A baixa produção se prolongou na administração do atual diretor, Leandro Daiello, que está no cargo desde o início do governo Dilma Roussef.

Ainda segundo a Fenapef, em 2010 a Federal indiciou 3.874 pessoas por formação de quadrilha; 771 por peculato; nove por emprego irregular de verba pública; 99 por cobrança de propina; 367 por corrupção passiva; 1.201 por crime contra o sistema financeiro; e 456 por lavagem de dinheiro. Naquele ano, a PF também indiciou 704 prefeitos por crime de responsabilidade.

Agora em 2013, de janeiro até o fim de novembro, data do levantamento da Fenapef, a Polícia Federal indiciou 759 pessoas por formação de quadrilha; 185 por peculato; uma por emprego irregular de verbas públicas; 14 por concussão (cobrança de propina); 78 por corrupção passiva; e 123 por lavagem. Nestes 11 meses, 102 prefeitos foram indiciados por crime de responsabilidade.

A Fenapef, formada por agentes, escrivães e papiloscopistas, reivindica reajustes na remuneração e ocupação de cargos que, hoje, são reservados a delegados e, em, menor número, a peritos. Em novembro, o governo chegou a repetir a oferta de reajuste escalonado de 15,8%. Mas a proposta foi rejeitada.

Os agentes dizem que o reajuste parcelado resultaria num aumento de pouco mais de R$ 200 por ano. Para eles, se aceitassem essa proposta, os policiais teriam poucas vantagens materiais.

“Hoje, ao tomar posse, qualquer delegado já assume um cargo de chefia na Polícia Federal. A administração dividiu unidades só para que mais delegados possam ser chefes de setores, que antes eram dirigidos por apenas um profissional. Até o canil da Polícia Federal, que fica em Brasília, tem um delegado como chefe. Lá no canil, o que ele vai investigar? Nada”, diz o agente Marcus Firme.

 

 

OUTRAS NOTÍCIAS

Levantamento alerta para direitos do servidor público estudante

1ª Turma mantém júri do caso Villela

Agente da PF ganha direito de remoção após ser vítima de assédio

Texto da reforma da Previdência é aprovado na CCJ