A desmilitarizção da polícia e o direito de greve

Data: 22/04/14

O Artigo 42 da Constituição Federal de 1988 institui a hierarquia e disciplina como mecanismo para a polícia militar e o Artigo 142, de modo ainda mais claro, veda aos militares sua organização em sindicatos e a possibilidade de fazer greve. Aí começa a crise de identidade da polícia brasileira. 

A militarização da polícia é um problema tão grave que, historicamente, impede os trabalhadores em segurança pública de se organizar em sindicatos e de entrar em greve. E o porquê disso se materializa na ideia de que eles não podem ser enxergados como trabalhadores em si, mas como militares. Essa visão é errônea porque deturpa o papel da polícia dentro das políticas de segurança pública. Ao invés de investir em políticas mais globais de segurança pública, como uma ampla reforma prisional, o Estado brasileiro prefere transformar policiais em militares, herdando o peso negativo da ditadura militar, e lhes negando o direito de greve. A crise de identidade se instaura porque, em primeiro lugar, a constituição chama no Artigo 42 as forças de patrulha dos estados de militares e, no Artigo 142, lhes nega o direito de greve. Por isso, criminaliza-se o direito de fazer greve e a principal culpa é da militarização.

Por isso, policiais não entendem a importância da discussão sobre a desmilitarização da polícia e somente nesse contexto sentem na pele a criminalização de um direito fundamental que é garantido aos demais trabalhadores e somente a eles é negado, o direito de greve. Novamente, destaco isso como traço de um país de traços autoritários com forças de patrulha armadas para executar, ao invés de investigar e prender e o Estado manter preso em condições dignas de trabalho e educação. O problema da militarização se centra na ideia de que o policial militar é o principal responsável pela segurança pública e não pode ser assim. Uma política global de segurança pública diz respeito, inicialmente, à reformulação dos presídios e penitenciárias, com políticas em rede de educação, saúde e segurança, melhoramento da tecnologia existente, condições dignas de trabalho e o trabalho visto como item da dignidade humana. Não o trabalho burguês, difundido nos presídios norte-americanos, mas o trabalho digno, contínuo em horas comuns ao trabalhador. O segundo passo é assistencial: ainda que nos últimos dez anos tenhamos reduzido os índices de miséria social e extrema-pobreza, a classe trabalhadora expandida nos últimos dez anos de governo Lula-Dilma necessita da garantia de serviços essenciais, como saúde e educação. Em outras palavras, não é intervenção militar que a periferia precisa, mas saúde e educação, em todas as calçadas e subidas de morro.

A militarização é um câncer que coloca o policial como herói e visão. É o herói das elites atrasadas que não querem perder o pato dos ovos de ouro do sistema capitalista. É o vião da periferia, porque as populações avizinhadas ao tráfico sabem muito bem que a polícia não lhes garante segurança e, ao contrário, em muitos contextos, muito mais perigo. A presença da polícia para quem nasceu e se criou na periferia é, no mínimo, preocupante. Ao invés de querermos debater redução da maioridade penal, deveríamos discutir o projeto de PEC 51/2013, de autoria do Senador Lindbergh Farias (PT-RJ) de desmilitarização da polícia que abre precedente para o assassinato pelo Estado da juventude negra, que legitima os autos de resistência, a falta de direito de greve ao policial que não é, sequer, enxergado como trabalhador em segurança pública.

Essa semana peguei um taxi com um policial que faz corridas em horário especial quando não trabalha. “Esses Zé ruela fica mandando a gente bater...” “A gente só bate em negro e pobre”. Não é possível continuar com uma polícia sem identidade, em plena crise, com total desrespeito ao trabalhador e ao negro e pobre da periferia que apanha e é assassinado por essa polícia. O debate aqui é além do supérfluo do que alguns pensam que não queremos polícia. Queremos sim. O que não queremos é uma polícia que mata e que, graças ao seu status de militarizada, não tem direito a fazer greve, porque é militar.

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