Dilma edita MP que acirra disputa interna da Polícia Federal

Data: 15/10/14

A presidente Dilma Rousseff editou uma medida provisória (MP), publicada nesta terça-feira no Diário Oficial da União, dando aos delegados da Polícia Federal (PF) a exclusividade de ocupar o cargo de diretor-geral do órgão. A medida agradou os delegados, mas gerou revolta em outras categorias que compõem a PF, como agentes, escrivães e papiloscopistas. O texto da medida também dá margem para interpretar que qualquer cargo de direção do órgão seja ocupado somente por delegados, mas o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, nega que isso seja verdade. A MP determina ainda que só poderão se tornar delegados da PF bacharéis em direito que tenham pelo menos três anos de atividade jurídica ou policial.


O texto da MP diz que os delegados "são responsáveis pela direção das atividades do órgão e exercem função de natureza jurídica e policial, essencial e exclusiva de Estado". Cardozo afirmou que o texto não é dúbio e não veda a ocupação de postos de direção por agentes, papiloscopistas e escrivães. Segundo ele, o texto diz apenas que a direção do órgão, ou seja, o posto de diretor-geral, cabe a um delegado.


- No começo do governo Dilma, quando estávamos escolhendo a direção-geral, eu recebi sugestão de gente que não era da PF, mas de políticos. Queremos assegurar formalmente que será um delegado o diretor-geral - disse Cardozo, justificando ainda a exclusividade de delegados ocuparem esse posto: - A função central da PF é ser polícia judiciária, é a investigação. E a investigação é por inquérito. Quem preside o inquérito? O delegado. Então quem deve comandar a PF? Um delegado.
Cardozo disse ainda que as críticas internas na PF se devem a uma disputa corporativa.

 


- O problema é que quando se cria alguma coisa que favorece os delegados, os agentes são contra. Quando se cria alguma coisa que favorece os agentes, os delegados são contra. A MP buscar harmonizar a PF - disse o ministro da Justiça


Um dos críticos da MP é Luís Antônio Boudens, vice-presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), que representa todas as categorias. A Fenapef está reunida por meio de videoconferência com os vários sindicatos filiados para discutir o que poderá ser feito contra a MP. Greves e manifestações não estão descartadas. Segundo Boudens, o grupo de trabalho criado no Ministério da Justiça (pasta à qual a PF é vinculada) e no Ministério do Planejamento para discutir mudanças na carreira ainda não terminou de analisar o assunto, mas foi atropelado pelo governo para conceder benesses aos delegados. A briga entre delegados e outras categorias é antiga dentro da PF. Boudens diz que a MP, na prática, abre caminho para que os delegados se descolem das outras carreiras e tenham reajustes maiores.


— Eles (o grupo de trabalho) não haviam terminado ainda os trabalhos. E o governo atravessou para atender apenas os pleitos dos delegados. Essa MP tramitou apenas um dia entre Ministério da Justiça e Casa Civil. É um recorde. Estamos questionando junto ao governo e já tivemos reunião com a direção-geral da PF. Foi uma coisa muito rápida, que está causando desconfiança interna sobre o que levou o governo a editar a medida — afirmou Boudens, acrescentando: — Essa pretensão de cobrar o diploma de direito mais a natureza jurídica e policial da carreira é um projeto para receber 90,25% do salário de ministro do Supremo Tribunal Federal (o teto do funcionalismo público). É um projeto salarial.


O presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), Marcos Leôncio Ribeiro, rebate os argumentos de Boudens. Segundo ele, desde o governo Fernando Henrique Cardoso, os diretores-gerais do órgão são escolhidos entre os delegados. Mas antes disso, foram escolhidos diretores de fora do quadro, em especial militares. Com a MP, há uma garantia de que o posto seja ocupado por alguém de dentro da corporação. Ribeiro disse também que nunca houve vinculação entre o salário de delegado com outras categorias, logo a MP não teria efeitos práticos nesse sentido.


— A exigência de bacharel existia em portaria, não em lei. Agora, qual é a novidade? São os três anos de atividade jurídica ou policial. Havia muita reclamação de que no posto de delegado havia jovens, concurseiros que tinham o primeiro emprego como delegado — afirmou Ribeiro.


Na semana passada, parlamentares já haviam tentado aprovar a exigência legal de que os delegados de Polícia Federal fossem bacharéis em direito e tivessem três anos de experiência em atividade jurídica ou policial para ingressar na carreira. Era uma emenda do deputado Bernardo Santana (PR-MG), relator de outra medida provisória que afetava a carreia dos policiais federais. No fim, foi aprovada apenas a parte concedendo reajuste de 15,8% para agentes, escrivães e papiloscopistas da PF. Essa MP precisa ser aprovada pelo Senado até 28 de outubro para não perder a validade.


Na ocasião, os agentes da PF já se posicionavam apenas pela votação do reajuste. Outros parlamentares - o senador Gim Argello (PTB-DF) e os deputados João Campos (PSDB-GO) e Ronaldo Fonseca (PROS-DF) - apresentaram emendas, também rejeitadas, estabelecendo que o cargo de diretor-geral seria exclusividade dos delegados. Segundo o presidente da ADPF, o governo não quis mudar essa MP, mas topou editar outra, especificamente para os delegados, que foi finalmente publicada nesta terça-feira.


— Vínhamos negociando com o governo, e nada de ter uma resposta. Tentamos fazer uma emenda na medida provisória. Mas o governo não aceitou que interferissem naquela MP. O governo disse que aceitava sentar e negociar outra MP — afirmou Ribeiro, acrescentando: — Houve a conclusão de uma negociação que se arrasta desde 2012.


A MP editada nesta terça-feira estabelece ainda que a PF é integrante da estrutura básica do Ministério da Justiça. O órgão já era vinculado à pasta, mas isso não era explicitado na lei.

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