Motivos contra a aprovação e homologação da MPV 657/2014

Data: 05/11/14

Exmos Srs (as),


Tenho motivos de sobra para ser CONTRA A APROVAÇÃO DA MPV 657/2014, pois o artigo 144 da Constituição Federal de 1988, estabelece que “a segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos”. E pensando nisto, o próprio PLANO NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA, exige o envolvimento não só dos servidores públicos da área de segurança pública, mas também da sociedade civil e entidades privadas.


Isto posto, primeiramente como cidadão, e posteriormente como servidor público atuante há 27 anos em Segurança Pública, destes, 10 anos como Policial Militar e 17 anos como Agente de Polícia Federal. Em que creio ter desenvolvido conhecimentos e experiências relacionadas à matéria de Segurança Pública, tanto sob a ótica militar quanto a civil, principalmente no que concerne a prática empírica, me tornaram um policial mais completo, porém, questões estruturais e organizacionais que persistem em nossa VELHA SEGURANÇA PÚBLICA, impedem a mim e meus pares, como profissionais e operadores de segurança pública, um melhor servir à sociedade.


Os melhores, mais eficazes, transparentes e sérios modelos de polícia do mundo atual, se prezam pela adoção e manutenção da “MERITOCRACIA” (experiência profissional) através de uma POLÍCIA DE CICLO COMPLETO, em que uma mesma polícia, exerce desde a presença ostensiva e uniformizada nas ruas, em prevenção aos delitos e manutenção da ordem pública, com interação direta com o cidadão-cliente, a até a realização de atividade de polícia judiciária ou de investigação criminal, mediante o uso continuado da informação, sem sua fragmentação, com a “MULTIDISCIPLINARIDADE DE CONHECIMENTO” à CIÊNCIA POLICIAL.


Da mesma forma, as polícias brasileiras necessitam levar em consideração a realidade globalizada de uma sociedade cada vez mais complexa e de risco, que não pode mais ser compreendida à luz de pensamentos simplificadores, redutores ou mutiladores, notadamente uma visão engessada sobre SEGURANÇA PÚBLICA. Urge a necessidade de uma visão INTERDISCIPLINAR, e mais modernamente, uma ABORDAGEM TRANSDISCIPLINAR, para demonstrar que a CIÊNCIA POLICIAL não possui um objeto singelo e uno, mas sim, complexo e plúrimo, pois a prática criminosa não conhece fronteiras, e muito menos se prende tão somente aos conhecimentos jurídicos, e para tanto, o seu trato depende de uma vasta gama do saber, tais como, criminologia, biologia, sociologia, psicologia, ciência da computação, matemática, física, engenharia, gestão pública, segurança pública e etc.


A TRANSDISCIPLINARIDADE está presente nos meandros da CIÊNCIA POLICIAL, e para tanto, os operadores de segurança pública, necessitam de um NOVO MODELO DE POLÍCIA, que possibilite o desenvolvimento de competências e cognições profissionais para o pleno atendimento de serviços prestados à sociedade atual, com o entendimento e domínio da CRIMINOLOGIA, a qual, também é uma ciência empírica e interdisciplinar, que se ocupa do estudo do crime, da criminalidade e suas causas, da pessoa do infrator, da vítima, do controle social do comportamento delitivo, bem como da personalidade do criminoso e da maneira de ressocializá-lo.


“A gestão pública deve fazer parte de um projeto amplo de desenvolvimento”.


Portanto, o desenvolvimento das organizações públicas contribui para a melhoria dos processos, da informação e da capacitação. Os governos precisam ter sua atuação baseada em estabelecimento de estratégias que envolvem a análise de cenários, o desenvolvimento de visão de futuro e a verificação constante das alterações ocorridas.


Sendo assim, para enfrentar os complexos problemas existentes torna-se cada vez mais relevante a capacitação dos profissionais que devem atuar de maneira interdisciplinar e multissetorial no setor público.


Cabendo relembrar, que nós OPERADORES DE SEGURANÇA PÚBLICA (AGENTES, ESCRIVÃES, PAPILOSCOPISTAS e PERITOS), somos aqueles que estamos diretamente em contato com os cidadãos, e consequentemente com os crimes que assolam a nossa sofrida sociedade, que diuturnamente padece diante das crescentes ondas de violência.


Portanto, não posso ser omissivo neste importante momento, em que querem aprovar a MPV 657/2014, em benefício apenas de um cargo, a de Delegado de Polícia, em DETRIMENTO DO INTERESSE DA COLETIVIDADE e da SOCIEDADE, e que insiste em seguir na contramão das necessárias REFORMAS DA SEGURANÇA PÚBLICA, trazendo não somente obstáculos, mas grande prejuízo à evolução da NOVA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, a qual, deve se pautar pelas necessidades do CIDADÃO-CLIENTE, e não mais pelo princípio paralisante do controle rígido dos processos administrativos.


“Infelizmente, com a MPV 657/2014, quem perde é a própria sociedade.”


A escola da NOVA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, prega dentre muitos outros princípios, a GESTÃO DIRECIONADA AO CIDADÃO, com a devida VALORIZAÇÃO DO SERVIDOR, e com CONTROLE DOS RESULTADOS (focada em resultados, em que estimula a flexibilização, inovação e criatividade, em que o controle é feito com base em indicadores de desempenho).


A gestão pública tem que ser EMPREENDEDORA, pois, com as transformações mundiais ocorridas nos últimos anos, um novo desafio apresenta-se diante dos gestores públicos: tornar a sua gestão mais flexível, eficiente, respeitando os valores éticos, com transparência e honestidade. Enxergar o governo como uma entidade dinâmica e estimuladora da sociedade através do desenvolvimento de suas atividades, incorporando a participação do povo nas decisões do Estado. Estimular valores democráticos: igualdade, dignidade, participação e representatividade. Ter foco nos resultados e não somente nos procedimentos, processos e recursos, buscando atender às demandas dos cidadãos e não da própria burocracia. Seu planejamento estratégico considera a prevenção como um fator imprescindível para o aproveitamento de recursos (físicos, financeiros, humanos, dentre outros).


Seu foco é na prevenção de possíveis problemas e não na geração de mais problemas, o que é o negativo caso da MPV 657/2014, que além de concentrar maiores poderes internos, de gestão e de comando nas mãos de um despreparado e único cargo, aumenta ainda mais o abismo entre as necessárias mudanças de modelos de polícia, bem como, fomenta a discórdia dos operadores de segurança pública (Agentes, Escrivães, Papiloscopistas e Peritos) com os pseudo-gestores (Delegados de Polícia).


Cabe aqui destacar, que o cargo de Delegado de Polícia, não é, e nunca deveria ter exclusividade na função de comando e gestão do órgão público, posto que tal cargo, existe tão somente no Brasil, para condução do famigerado e ultrapassado IPL-INQUÉRITO POLICIAL, cujo instrumento, prevalece o entendimento na doutrina e na Jurisprudência, de que é DISPENSÁVEL para o oferecimento da AÇÃO PENAL, além do que, também fere a democracia, ampla defesa e ao direito do contraditório.


O IPL-INQUÉRITO POLICIAL é um PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO e INQUISITORIAL, que em muitos casos, além de estatisticamente não se mostrar eficaz na elucidação dos crimes, ainda tem servido como INSTRUMENTO DE CHANTAGEM nas mãos de inescrupulosos DELEGADOS DE POLÍCIA (vide reportagem: http://www.prsp.mpf.mp.br/sala-de-imprensa/noticias_prsp/13-10-14-justica-condena-delegada-da-pf-e-mais-tres-pessoas-por-exigirem-dinheiro-de-advogado-sob-investigacao e http://luispablo.com.br/politica/2014/09/escandalo-familia-do-delegado-federal-que-abordou-aviao-de-edinho-lobao-atua-na-campanha-de-flavio-dino/).


Isto posto, deve-se questionar a ânsia de poder pretendido pelo cargo de Delegado de Polícia, que além de querer se firmar como único gestor público dentro da Polícia Federal, ainda pretende se desviar da especialização da ATIVIDADE FIM, que é a CIÊNCIA POLICIAL e CRIMINOLÓGICA, haja vista, que almejam a CARREIRA JURÍDICA, numa clara demonstração de “CRISE DE IDENTIDADE”, em que não sabem se são policiais ou juristas.


Outra grande preocupação, é que se concederem o reconhecimento de CARREIRA JURÍDICA para os mesmos, futuramente irão pretender se enquadrar aos demais benefícios que gozam os servidores exclusivos de tal carreira, a exemplo de Promotores, Procuradores e Juízes, e se entende, inclusive o “FORO PRIVILEGIADO”. Aí eu vos pergunto: “Quem irá investigar os desvios de conduta dos Delegados de Polícia?” (Vide:http://g1.globo.com/ap/amapa/noticia/2013/11/delegado-federal-preso-pela-pf-no-amapa-e-transferido-para-brasilia.html e http://minard.com.br/2014/06/19/operacao-maracanazo-delegado-da-policia-federal-e-preso-tentando-extorquir-r-300-mil-de-um-politico/).


Afora isso, ainda pesa contra o cargo de delegado, que sua formação é exclusivamente voltada para a CIÊNCIA JURÍDICA, portanto, faltando-lhe a devida competência e conhecimento técnico em ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, para exercer a atividade de GESTÃO PÚBLICA, além do que, qualquer novo Delegado de Polícia ao assumir o cargo, muitas vezes já assume a função de chefia, sem o mínimo de conhecimento, competência e experiência policial para esse mister. Assim sendo, a criação e promulgação da MPV 657/2014, também afronta a atual POLÍTICA DE SEGURANÇA PÚBLICA, em que a escolha do GESTOR do órgão, ficará exclusivamente sob a responsabilidade do PRESIDENTE DA REPÚBLICA, o que torna temerário tal INDICAÇÃO POLÍTICA, e portanto, capaz de transformar a POLÍCIA FEDERAL numa POLÍCIA DE GOVERNO e não de ESTADO.


Desta forma, a aprovação da MPV 657/2014, como parte integrante da regulamentação do § 7º do art. 144/CRFB (A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades), afronta as diretrizes da atual POLÍTICA DE SEGURANÇA PÚBLICA, a qual passou por longo processo de estudos e amadurecimento a partir do 1º CONSEG-Conferência Nacional de Segurança Pública, este, considerado um marco histórico na política nacional, apresentando-se como um valioso instrumento de gestão democrática para o fortalecimento do SUSP-Sistema Único de Segurança Pública, dentro de um novo paradigma iniciado pelo PROGRAMA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA COM CIDADANIA-PRONASCI, em que se previa, que importantes decisões serão tomadas, de forma compartilhada, entre a sociedade civil, poder público e trabalhadores da área.


Importante destacar, que a figura do Delegado de Polícia no Brasil, não investiga nada, pois quem executa todos os trabalhos de INVESTIGAÇÃO, são os OPERADORES DE SEGURANÇA PÚBLICA (AGENTES, ESCRIVÃES, PAPILOSCOPISTAS e PERITOS), os quais, lidam diretamente com o crime, materializando provas comprobatórias de culpabilidade, coletando informações, filmagens, fotos, gravações, expedindo relatórios, autos circunstanciados e demais laudos, cujo trabalho laboral, é apoderado de forma espúria pela figura de Delegado de Polícia, que dentro de sua sala dotada de ar condicionado, e com altos salários, simplesmente copia e cola as informações, anexando a produção laboral daqueles que são usurpados como investigadores e operadores de Segurança Pública. Aqui faço uma pergunta simples e direta: “Como pode um Delegado de Polícia fazer a representação de um crime se nunca foi a campo para investiga-lo?”.


Somente no Brasil, adota-se este falido modelo de polícia, diferentemente de outros países, nos quais, os OPERADORES DE SEGURANÇA PÚBLICA já atuam diretamente e lado a lado com o MINISTÉRIO PÚBLICO, dando maior eficiência, celeridade e transparência à PERSECUÇÃO CRIMINAL, eliminando assim, o burocrático, antidemocrático, ineficaz, improdutivo e custoso IPL-INQUERITO POLICIAL, uma vez que o valor que o Estado gasta com um Delegado de Polícia, não se justifica pela sua manutenção, e muito menos do combalido IPL.


Desta forma, espero ter exposto aos Exmos Senhores, o entendimento deste cidadão e servidor público quanto à questão da criação, aprovação e promulgação da nociva MPV 657/2014.

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