Tem sido difícil acordar...

Data: 20/05/15

Tem sido cada dia mais difícil acordar. Não. Acho que o problema não é acordar. A luta maior é para sair da cama e encarar o mundo. Mesmo após 19 anos de uma escolha que já se mostrou equivocada, ainda insisto em seguir adiante. Acho que é para não dar o braço a torcer, simplesmente. De qualquer forma é impossível esconder do mundo a vergonha que sinto.

Vergonha de me ver pertencente ao esdrúxulo sistema de segurança pública do país. Vergonha por fazer parte de uma farsa contada aos brasileiros há séculos. Não, meus caros. Não acreditem em segurança pública. Ela não é pública. Isso não existe no Brasil. Ou então, pode ser que o mundo inteiro esteja errado e nós, os bravos guerreiros tupiniquins, estejamos cobertos de razão em manter nossa estrutura de segurança como ela é. Talvez seja isso.

Provavelmente estejamos indo pelo caminho correto, quando nosso índice de resolução de homicídios é de menos (bem menos) de dez por cento. Errados são os países que têm índices superiores a setenta por cento. Eles são o mau exemplo. Nós, singulares em nossa conduta, deveríamos ser a referência seguida por eles.

Nossa sociedade repleta de segregações, veladas ou não, encontra espelho na organização de nossas polícias ostensivas, que jamais deveriam ser regidas por códigos militares, mas que são o retrato escancarado do abismo social da pátria desnorteada. Pobres, com poucas chances de estudar, serão sempre os soldados comandados pelos filhos da classe média, com condições de pagar os bons cursos preparatórios para posteriormente ingressarem nas escolas de oficiais. Algo sem similares no mundo, nossos policiais ostensivos, mesmo com jurássicos anos de atividade de combate ao crime, serão comandados por imberbes oficiais com a vasta experiência dos três ou quatro anos de escola de formação.

Preciso dizer que a maioria absolutíssima desses jovens egressos são de muito boa índole, com sonhos de fazer diferença na vida das pessoas. Até que a realidade de uma vida de caserna policial (?) os atinge como um trem desgovernado. E por mais que sejam destemidos e bravos com anseios de mudança terão que enfrentar a verborragia de gestores que emitem ordens incoerentes, repletas de influências fascistas, que não estão acostumados a ouvir a palavra NÃO como resposta aos seus intentos megalômanos. Gestores que enchem até mesmo o coração de orgulho quando são comparados a personagens cinematográficos caracterizados por seu excesso de condutas violentas.

Olho para nossos métodos e, muitas vezes, a tendência é de rir. Não. Gargalhar mesmo. Vejo em algumas unidades de polícia do país inquéritos policiais, ainda em andamento, instaurados há mais de uma década. Como em um livro de Kafka, a engrenagem range e gira pouco, quase nada. É como se tudo isso, há centenas de anos quando foi criado por aqui, tivesse sido planejado para dar errado. Sabemos que existem abnegados policiais de todas as categorias que lutam contra isso, tentando atingir uma celeridade, que parece um ser mitológico. Mas é uma luta inglória. Logo são identificados por pares interessados na continuidade da desgraça e colocados no seu devido lugar. Lugar onde possam esquecer e ser esquecidos de seus devaneios de produtividade.

De qualquer forma, o ingênuo “Zé Ninguém”, figura maior do segmento conhecido como “Povo”, jamais saberá disso. A ele sempre será negada a verdade. Parecerá aos seus olhos que pomposos seres em seus gabinetes refrigerados sejam realmente os salvadores da pátria em investigações mirabolantes, que tiram de circulação inimigos públicos cada vez mais dotados de superpoderes. Na verdade, o único superpoder que esses bandidos têm é retangular, feito de papel e atende pelo nome de Dinheiro.

Então a sociedade pede em uníssono: “Tem que prender!!!” E eu, mais uma vez, e me desculpem por isso, acabo rindo disso tudo. Nosso insuperável sistema carcerário, sem parâmetros em todo o mundo verdadeiramente civilizado, será o responsável pela reeducação de indivíduos que compram sem pestanejar, até mesmo mães novas para si mesmos? Alguém realmente acredita que a vida de um bandido milionário (se for do ramo de petróleo, será bilionário) muda em muitos presídios deste país? Será? Acredito piamente que uma parcela considerável dos agentes e inspetores penitenciários cumprem seu papel com honradez e coragem. Mas já passamos da época em que acreditávamos em um velho barrigudo e barbudo a distribuir presentes no Natal. Não. Não acreditamos mais nesse velhinho vestido de vermelho.

Enquanto a polícia, o sistema penitenciário e os instrumentos de investigação não forem tratados com seriedade estaremos sempre imersos num porão transbordando de piadas de mau gosto. Por quanto tempo seremos obrigados a ver o sistema privilegiar concursos para gestores inexperientes, deixando em segundo plano o que mais importa para objetivo da polícia, que é colher provas? Sinceramente, eu gostaria de parar de achar graça disso. Queria abrir os olhos, como fazia há muitos anos, levantar e sentir que estar ao lado da lei tem algum sentido nesta vida.

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