O risco eletrolão

Data: 03/08/15

Operação Lava Jato chega ao setor elétrico e lança nova frente de incerteza sobre o desempenho da economia neste ano

 

Em poucos meses, a Operação Lava Jato, conduzida pela Polícia Federal em conjunto com o Ministério Público, transformou-se de uma investigação de esquema de lavagem de dinheiro em um posto de gasolina para o maior caso de corrupção do País. Por conta das suspeitas envolvendo a Petrobras, passou a ser apelidada de “petrolão”. Na última semana, ao avançar por uma nova frente, o caso ganhou mais uma denominação: “eletrolão”.

Pela primeira vez, os agentes federais apreenderam documentos e dirigentes do setor elétrico, um passo amplamente esperado diante das denúncias já levantadas em delações premiadas de executivos detidos pela Lava Jato, que apontavam o pagamento de propinas em contratos da usina de Angra 3. As prisões do presidente afastado da Eletronuclear, almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, e do CEO da Andrade Gutierrez Energia, Flávio Barra, agora reforçam as suspeitas e se somam aos indícios de outras irregularidades envolvendo a holding estatal Eletrobras, lançando uma sombra de incertezas sobre o setor.

O risco é de uma repetição da paralisia que tomou conta da Petrobras e de sua rede de prestadores de serviço no início do ano. As suspeitas mobilizaram a alta cúpula da estatal obrigando-a a cancelar contratos, colocando em dificuldades uma parcela relevante de fornecedores. A publicação tardia do balanço, provocada por exigências dos auditores, forçou um rebaixamento na classificação de risco da petroleira, complicando o acesso ao crédito. Embora a Eletrobras seja um gigante menor, na comparação com a Petrobras, analistas enxergam um potencial de dano semelhante, ainda que em escala mais reduzida.

Trata-se de mais um peso para a já combalida atividade econômica neste ano, que caminha para uma recessão de quase 2%, segundo as projeções de mercado. Só a fase do petróleo da Lava Jato é apontada como responsável por retirar quase R$ 90 bilhões do PIB de 2015 e eliminar cerca de 200 mil postos de trabalho, segundo estimativas da FGV. Em reunião com ministros, na última semana, a própria presidente Dilma citou uma estimativa de contribuição negativa, de um ponto percentual do PIB. Tentativas de calcular o impacto econômico do caso, porém, perdem a validade em pouco tempo.

Com 13 subsidiárias, a Eletrobras conduz o segundo maior pacote de investimentos das estatais. O plano prevê um desembolso de R$ 14,5 bilhões neste ano, próximo de 44% do total estimado para todo o setor elétrico. Os projetos que demandam a maior parte dos recursos são Angra 3 e as usinas de Belo Monte, Jirau e Santo Antônio, no Norte do País. Mais do que a paralisia no presente, portanto, as dificuldades decorrentes das denúncias podem comprometer a expansão da capacidade dos parques de geração, transmissão e distribuição, que contribuiriam para garantir o abastecimento de energia no futuro.

Dados do setor dão a dimensão do risco. O sistema Eletrobras é responsável, atualmente, por cerca de um terço da geração de energia do País e quase metade da transmissão. “A Lava Jato atrapalhará, porque as auditorias já fazem ressalvas nos balanços”, afirma Cláudio Salles, do Instituto Acende Brasil. “Não é possível saber em que medida, em termos de custo e prazo, mas não há dúvida de que gera problemas de credibilidade e de financiamento.” Desde o anúncio da redução das tarifas, em 2012, a Eletrobras acumula um prejuízo de cerca de R$ 9 bilhões.

Analistas chamam a atenção para o alto nível de endividamento da estatal, de mais de R$ 30 bilhões. Em maio, a Moody’s rebaixou a nota de crédito, retirando seu selo de bom pagador. Na justificativa, a agência citou o contraste entre o “ambicioso” plano de investimento – com destaque para Angra 3 – e a pobre geração de caixa. Também enfatizou as dúvidas em relação à Operação Lava Jato. O balanço do primeiro trimestre, que mostrou um lucro de R$ 1,1 bilhão, trouxe uma ressalva da auditoria, pela dificuldade em mensurar os impactos da operação policial.

O mesmo problema impediu que a Eletrobras enviasse informações exigidas pelo mercado americano, o que compromete a sua credibilidade. Assim como a Petrobras, a estatal elétrica tem papéis negociadas na Bolsa de Nova York e também foi processada por acionistas estrangeiros. Uma comissão interna foi montada para apurar as denúncias – as suspeitas também recaem sobre Belo Monte. A estatal recorreu à Justiça para obter acesso às provas, mas teve os pedidos negados.

Para os analistas, os novos fatos reforçam a necessidade de a Eletrobras buscar saídas para melhorar o desempenho e a saúde financeira, entre as quais a venda de distribuidoras deficitárias no Norte e no Nordeste e o reforço dos quadros técnicos. “A companhia passou por uma interferência governamental muito grande e está muito endividada”, diz o estrategista-chefe da XP Investimentos, Celson Placido. “Não adianta tapar o sol com a peneira: precisa reduzir o endividamento e alcançar geração de caixa positiva.”

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