Aumento da criminalidade está relacionado a atraso de salários e corte de verbas, dizem entidades

Data: 11/08/15

Com viaturas sem rodar por falta de combustível, os policiais desanimam e o bandido "cresce o olho"

A situação na segurança pública do Rio Grande do Sul desandou, e os primeiros a admitir isso são policiais — alguns, sob o manto do anonimato, para evitar represálias, outros, às claras, como os representantes das entidades sindicais do setor. O Estado vive há mais de uma semana uma onda de criminalidade sem precedentes neste ano e até em épocas recentes. Um exemplo: em dois dias da semana passada, 84 veículos foram roubados na Capital (a mão armada, com ameaça ao motorista). A média diária é de 25.

Com 55 homicídios, início de agosto é o mais violento desde 2011

Crimes de sangue também proliferaram. Entre segunda, 3 de agosto, e sexta, 7, foram 13 homicídios em Porto Alegre, contra seis na semana anterior. Houve também latrocínios (roubo com morte), cujas vítimas incluem policiais de folga. A escalada de mortes teve três chacinas no fim de semana, na Capital.

No interior, o impacto em uma cidade dominada por bandidos. Uma quadrilha assaltou dois bancos ao mesmo tempo em Imigrante, impediu a ação policial e fez mais de uma dezena de reféns. Foi o terceiro episódio do gênero em poucos dias. Em Canguçu, os dois únicos PMs de serviço na cidade viram cinco homens assaltarem um banco, sexta-feira. No mesmo dia, o mais acintoso crime desse tipo: dois homens assaltaram um posto do Banrisul situado dentro do perímetro da sede da Secretaria da Segurança Pública (SSP) em Porto Alegre. Na noite desta segunda-feira, roubaram um carro-forte em Nova Petrópolis. Cinco veículos foram incendiados e a rodovia ficou interrompida.

Até rebelião em presídio, algo raro nas últimas décadas, ocorreu. Um grupo de 340 presidiários encarcerados na Penitenciária Estadual de Charqueadas fez os próprios familiares de reféns no domingo. Os apenados desistiram do protesto após receberem promessa de análise de seus benefícios por parte da Justiça.

A ação mais ousada dos criminosos coincide com o parcelamento do salário dos policiais e expõe deficiências no patrulhamento. A escalada de violência é apenas casual ou tem relação com as carências antigas e novas do policiamento? Para as entidades da categoria dos policiais, não é apenas coincidência.

— Os criminosos têm ouvidos, olhos, bocas e mais dinheiro que os policiais. Eles sentiram terreno fértil em um momento em que os agentes estão sem receber, e as viaturas, paradas por falta de combustível — afirma Isaac Ortiz, presidente da Ugeirm-Sindicato, entidade de classe dos agentes da Polícia Civil.

Ortiz destaca que a criminalidade no Rio Grande do Sul tem dado saltos de brutalidade. Mortes de crianças são frequentes, as de mulheres viraram rotina — algo impensável no código do submundo, anos atrás. Com viaturas sem rodar por falta de combustível ou de dinheiro para conserto, os policiais desanimam e o bandido "cresce o olho". O policial civil repara que o ritmo das operações para prisão de criminosos diminuiu, até pelo contingenciamento de recursos. Com menos homicidas e ladrões presos, aumentam os assassinatos e roubos.

— Para piorar a situação, o policial também está sem receber. Com isso, cresce o bico (segurança privada) e o risco de o agente morrer, porque trabalha sem equipamento e ajuda de colegas — relata Ortiz.

Na Brigada Militar, além de falta de combustível, várias viaturas ficaram paradas porque estavam com documentação vencida — e, em nítida operação-padrão, os PMs se recusaram a movimentá-las (como manda a lei, aliás). Leonel Lucas, presidente da Abamf (entidade de classe dos soldados da BM), ressalta que houve também corte em horas extras e diárias dos policiais. Desde março, foram três reduções em combustível.

— Uma viatura que rodava cem quilômetros por dia faz, hoje, 40. Só sai quando o rádio avisa sobre algum crime grave. Antes, havia patrulhamento preventivo, agora, só quando o delito ocorre — reclama Lucas.

O dirigente da Abamf diz ainda que existem apenas 19 mil PMs na ativa no Estado, quando o número deveria ser de 35 mil, se levado em conta o crescimento populacional. Uma carência em torno de 50%, estima Lucas. Algumas cidades, como Imigrante — onde ocorreu o assalto duplo a bancos (leia ao lado) —, tem um só policial militar atuando. Mesmo com carências, as polícias agiram e prenderam cinco assaltantes, na sequência.

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